domingo, 17 de agosto de 2014

Uma carta do Pe. Leopoldino sobre a Alexandrina

Traduzimos esta carta que vem nas págs. 773-774 de Cristo Gesù in Alexandrina. Ela é interessante sob muitos aspectos, sendo dois deles a situação médica concreta da Alexandrina naquele momento e o distanciamento que o pároco mantinha frente a ela.
Não sabemos nada sobre o destinatário.

Balasar, 30/4/1942

Rev. Pe. Ifigénio Adão Pinto Casalta, amigo e colega

Recebi a sua a que respondo.
A doente Alexandrina está tão grave que lhe administrei a sagrada Unção. Há cinco semanas que não ingere nada excepto a santa Comunhão diária e uma vez ou outra um pouco de água que nem sempre retém. A sua fraqueza é tal que não pode receber injecções: tudo lhe faz mal. Fala muito pouco e não dorme; geme apenas. O médico assistente, Dr. Azevedo de Ribeirão, disse-me que não sabe como possa viver; e está surpreendido que demore tanto a morrer.
Os fenómenos das sextas-feiras continuam mas noutra forma; até à sexta-feira de Abril (?), saía da cama e reproduzia ao vivo a Paixão; de sexta-feira santa para cá, entra em êxtase ao meio dia até às três e meia, mas não desce da cama, e tem dores horríveis…
Por isso não poderá sair de casa tão cedo e creio muito próxima a sua morte.
A doente é muito pobre; era uma camponesa e vive de esmolas porque não pode trabalhar; a mãe também é pobre.
Desde que está doente já foi duas vezes ao Porto para exames médicos, mas estes não conseguiram saber qual é a doença de estômago que a faz vomitar tudo; tiraram-lhe a radiografia. Quem tratou destas viagens foi o confessor e director espiritual Pe. Pinho, que arranjou os meios para o transporte e permanência no Porto para ela e para a irmã, que a acompanhou.
Tenho-me conservado estranho ao caso, limitando-me como pároco só a dar-lhe a Comunhão e a assistir como simples espectador aos fenómenos da sexta-feira.
Vieram cá Padres da Companhia (de Jesus) e seculares, médicos e outras pessoas, mas só com autorização do Pe. Pinho porque eu não tenho poder para isso a não ser que venha oficialmente, autorizado pelo Ordinário.
Na freguesia pouquíssimas pessoas sabem do facto e se alguma coisa transparece é pelos automóveis que estacionam frente à casa; mas agora são raríssimos por falta de gasolina.
Deverá ir a Coimbra?... Em Braga ou no Porto não haverá médicos competentes e de confiança do nosso Arcebispo para examinar a doente?
Ela nunca foi a Coimbra e a viagem é muito longa. Quando foi ao Porto o médico receou que morresse na viagem; e então estava muito mais forte do que agora porque se alimentava.
A Beata Alexandrina em êxtase. Ao lado esquerdo, fundo, vê-se a mão do Pe. Pinho e o caderno em que toma apontamentos.

A pedido do Pe. Pinho, o Dr. Elísio de Moura veio examiná-la e declarou que precisava de observá-la alguns dias para lhe estudar a doença.
Poderá ele fazer o que não conseguiram os médicos do Porto?
A doente ficou mal impressionada com médico do Dr. Elísio, que no exame usou modos muito bruscos, mesmo grosseiros, próprios para dementes mais que para pessoas mentalmente normais.
Informado dos fenómenos da sexta-feira disse tratar-se de histerismo; contestado com argumentos fundamentados nesta sua opinião declarou que ignorava tais fenómenos espirituais e que nenhum médico em Portugal está à altura de responder nestes assuntos.
Estando assim as coisas porquê mandar a doente a Coimbra? Para martirizá-la e matá-la, mesmo que involuntariamente?
Gostaria de ir a Braga para falar disto ao Arcebispo; e se o Dr. Ferreira de Macieira de Rates estivesse disposto a acompanhar-me explicaria a doença desde o seu princípio porque foi ele o médico que a assistiu mais tempo. Mas estou numa paróquia sem comunicações pelo que me é difícil a viagem a Braga. Vamos ver se a posso fazer.
À espera de novas ordens creia-me colega e amigo.
Pe. Leopoldino Rodrigues Mateus

Sem comentários:

Enviar um comentário