quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Antes da aparição da Santa Cruz (2)


As autoridades eclesiásticas bracarenses parecem ter-se mantido fiéis ao juramento prestado, mesmo com muito custo. Mas três anos mais tarde consideraram-se desligadas dele. Afinal os revolucionários de Vinte faziam pressão sobre o Rei, como se verificou após a Vila-Francada. Ora isso, viciava irremediavelmente o jogo político: não respeitavam a fidelidade que deviam ao Rei. No documento menciona-se o Conde de Amarante, primeiro militar a levantar-se contra os liberais.

Edital de 1823 contra “um governo intruso, tirânico e despótico, filho de uma facção rebelde”

O Doutor Manuel José Leite Pereira, Abade de S. Pedro de Maximinos, Desembargador, Provisor e Vigário Geral nesta Corte e Arcebispado pelo Ex.mo e Rev.mo Senhor D. Fr. Miguel da Madre de Deus, Arcebispo e Senhor de Braga, Primaz das Espanhas, etc., faço saber aos Rev.dos Párocos que, da parte dos Senhores Governadores do Arcebispado, me foi dirigida a Exortação seguinte:

Os Governadores do Arcebispado Primaz aos Rev.dos Párocos, ao Venerável Clero Secular e Regular e aos mais súbditos desta Santa Igreja.
Aparecendo a luz, dissipam-se as trevas e, aparecendo a verdade, dissipam-se os erros, os enganos, tais foram aqueles que motivaram a nossa exortação datada no dia 15 de Março de 1823, expedida por força da Régia Portaria do teor seguinte:

Manda El-Rei pela Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça:
Atendendo a que o terrível exemplo de perjuro dado pelo Conde de Amarante pode alucinar alguns incautos desconhecedores de seus verdadeiros interesses e consequentemente deixarem-se arrastar por mal-intencionados que só desejam ver derramado o sangue dos irmãos, parentes e amigos para, no meio da desordem, da confusão e da carnagem, darem cruento pasto a inveterados ódios e antigas rixas, sem lhes importar transpor todas as barreiras da humanidade, da honra e da probidade, virtudes inatas em verdadeiros Portugueses, contanto porém que imaginam conseguir assim os seus perversos e danados intentos, que o Reverendo Arcebispo Primaz ou quem suas vezes fizer ordene a todos os Párocos da sua Diocese instruam os seus fregueses no horror em que devem ter os que, violando um tão sagrado juramento como o que há pouco prestaram à Constituição da Monarquia, única forma de governo que pode fazer a felicidade dos Portugueses, se hão deixado, desapercebidos, fascinar por aquele rebelde, que verdadeiramente lhes façam sentir os iminentes males que lhes caberiam em partilha se deixassem contaminar-se com um tão execrando modelo, cumprindo ao mesmo tempo fazer-lhes conhecer quanta obediência devemos prestar à Constituição e leis regentes (vigentes?), o respeito devido às autoridades constituídas e quanto enfim seria terrível a Sua Majestade que mais sectário encontrasse o detestável exemplo de Vila Real, cujo estranho procedimento entre Portugueses tem profundamente magoado seu coração paternal.
Palácio da Bemposta, em 5 de Março de 1823.
José da Silva Carvalho

Por outras e por uma carta da Câmara, assinada por El-Rei, se expediram outras ordens que circulam por este Arcebispado isentas (?) às quais sacrificamos as nossas opiniões e vontades, obediência e respeito devido às reais determinações.
Soou depois a voz do nosso Augusto Soberano, Rei e Senhor, livre de coacção a que imperiosas circunstâncias o tinham sujeitado, e dissiparam-se os erros invencíveis, inculpáveis, e o engano com que nos tinha iludido um governo intruso, tirânico e despótico, filho de uma facção rebelde, que pretendeu destruir a autoridade do Rei Soberano, independente, em nome do mesmo Rei, e reconhecemos terem sido extorquidas, demos aquela exortação e outra ordem posterior com a mais criminosa fraude e opressão aos verdadeiros sentimentos de Sua Majestade e por isso revogamos, rescindimos e anulamos e abolimos a dita exortação e ordens posteriores e mandamos que sejam consideradas como se nunca tivessem existido e escusamos perpetuamente tudo aquilo que nelas se achar contrarie as verdadeiras intenções de Sua Majestade, ao qual (palavra ilegível) juramento de inalterável fidelidade e obediência.
E o Rev.do Desembargador-Provisor mandará passar ordens circulares com o teor deste edital para ser copiado nos livros respectivos das paróquias.
Dado em Braga aos catorze de Junho de mil oitocentos e vinte e três.

E não se continha mais no dito edital, em consequência do qual, por meu despacho, mandei passar a presente ordem para o Rev.dos Párocos da visita ao diante declarada para que em tudo a cumpram e guardem e façam observar publicando-a a seus fregueses à Missa conventual, copiando-a no respectivo livro, fazendo-a girar pela ordem do roteiro ao diante descrito e remetendo-a ao Pároco mais vizinho pelo mordomo da freguesia com a brevidade possível, sendo o último obrigado a remetê-la ao secretário da Câmara Eclesiástica que esta subscreveu, passando cada um recibo do dia e hora em que lhe foi entregue para por este modo me constar da sua inteira observância.
Dada em Braga, sob o meu sinal somente, aos vinte e um de Junho de 1823.
Eu, Custódio Luís de Araújo, secretário da Câmara Eclesiástica, a subscrevi.
Manuel José Leite Pereira

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