quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Antes da aparição da Santa Cruz (1)


Já noutra ocasião mostrámos como é importante conhecer certos documentos emanados de Braga para avaliar o contexto religioso e político concreto em que ocorreu a aparição da Santa Cruz em Balasar. É sabido que a década de vinte do século XIX foi conturbadíssima desde o seu princípio. A Junta Provisional de Supremo Governo do Reino saída da revolução do Porto, em Agosto, logo em Setembro impôs à Igreja um “juramento de fidelidade ao Rei, às Cortes e à Constituição que elas fizerem e de obediência ao Supremo Governo do Reino”. Jurar fidelidade a uma constituição que não existia era passar um cheque em branco aos revolucionários. Mas que se havia de fazer?
O extenso documento que se transcreve abaixo regista o juramento feito em Braga e a ordem para que o efectuassem todos os sacerdotes da Diocese. Como nele se manda, foi lido em todas as paróquias, logo também em Balasar.

Juramento de Fidelidade à Junta Provisional de Supremo Governo do Reino (1820)

O Dr. João José Vaz Pereira, Reitor do Seminário de São Pedro, Chantre na Sé Primaz, Desembargador, Provisor e Vigário Geral nesta Corte, Comarca e Arcebispado pelo Ex.mo e Rev.mo Arcebispo Primaz, etc., faço saber aos Rev.dos Párocos da visita abaixo declarada que da parte do mesmo Ex.mo e Rev.mo Arcebispo Primaz me foi enviada a Portaria e Auto abaixo copiado a fim de se expedir a presente para sua devida execução, o qual Auto e Portaria é do teor seguinte:

Auto de Juramento de Fidelidade
Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e vinte, aos vinte e um de Setembro do dito ano, nesta cidade de Braga e Paço Arquiepiscopal, em presença do Ex.mo e Rev.mo Senhor Arcebispo Primaz D. Fr. Miguel da Madre de Deus, compareceram o Rev.do Cabido da Santa Sé Primacial, os Rev.dos Ministros da Relação Eclesiástica, os Rev.dos Párocos das freguesias da mesma cidade e outros que nela se achavam presentes, como também os Rev.dos Reitores dos Seminários de S. Pedro e S. Caetano, os Capelães das Religiosas da dita cidade abaixo assinados a fim de prestarem juramento de fidelidade ao Rei, às Cortes e à Constituição que elas fizerem; e de obediência ao Supremo Governo do Reino. E assim com efeito o prestaram nas mãos de Sua Excelência Reverendíssima, conformando-se em tudo com as ordens do mesmo Supremo Governo e com o que se praticou no Auto de Câmara Geral da cidade do Porto e com a Portaria e Exortação de Sua Excelência Reverendíssima a todo o Clero do Arcebispado para satisfazerem o sobredito juramento, a qual Portaria é do teor seguinte:

Em observância das Ordens da Junta Provisional de Supremo Governo do Reino que mandam aos Rev.dos Párocos e mais eclesiásticos deste Arcebispado prestar juramento de fidelidade ao Rei, às Cortes, à Constituição que elas fizerem e obediência ao Supremo Governo, ordenamos ao nosso Cabido e aos Rev.dos Ministros da nossa Relação e aos Rev.dos Párocos desta nossa cidade compareçam perante Nós no dia vinte e um do corrente mês, pelas onze horas da manhã, a fim de prestarem o juramento na forma exposta, assinando o Auto que se há-de formalizar conforme o Auto da Câmara Geral feito e assinado na cidade do Porto, o que também praticarão os Rev.dos Vigários Gerais das comarcas nas mãos dos Rev.dos Vigários Gerais das vagantes e, achando-se algum destes impedido, nas mãos do pároco mais antigo da vila em que assiste.
E outrossim determinamos a todos e cada um dos Rev.dos Párocos do mesmo Arcebispado compareçam, os desta Comarca de Braga perante o nosso Rev. Desembargador Provisor e os da Comarca de Valença, Vila Real, Chaves e Moncorvo perante os Rev.dos Vigários Gerais respectivos a fim de igualmente prestar o juramento mencionado, o qual poderão satisfazer por seu bastante procurador aqueles que mostrarem achar-se gravemente impedidos por moléstia, o que hão-de cumprir dentro do peremptório termo de oito dias depois da intimação desta nossa Portaria, assim como serão obrigados todos os Clérigos de todas as Paróquias a comparecerem na Igreja, perante o seu respectivo Pároco para prestarem com toda a solenidade o mencionado juramento, que será remetido à cabeça da Comarca donde nos será enviado com o que aí mesmo se formalizar para ser por Nós remetido ao Supremo Governo em tempo breve.
Esperamos do patriotismo e mais virtudes do nosso respeitável Clero que gostosamente cumpra este dever, muito conforme à doutrina do Apóstolo que manda obedecer às autoridades constituídas, não só pelo temor, mas por consciência, roborando com palavras e exemplo a união e concórdia que tão felizmente tem reinado entre todos os Portugueses em crise na qual eram para recear-se os horrores da guerra civil e da anarquia, louvando por isso a Deus, dirigindo ao mesmo Senhor orações fervorosas a fim de que o desígnio e fadigas do Governo restaurador consigam a desejada reparação dos males que vão levando ao precipício esta nação digna de melhor sorte e que tanto se tem distinguido entre os povos cristãos mais civilizados esperando que recobre seu esplendor antigo conservada em toda a sua pureza a Santa Religião do Nosso Salvador Jesus Cristo, restituídos os nossos foros e regalias que a desgraça dos tempos tinham posto em deplorável esquecimento em que pelas Cortes Constitucionais se nos hão-de conservar ilesas, salva sempre a fidelidade e vassalagem que se deve ao nosso adorado Monarca Senhor D. João VI e à Augusta Dinastia da Casa de Bragança.
Confiamos no Senhor que nos dará os auxílios necessários para o complemento desta grande obra conservando no meio de nós a pureza da Fé, as doçuras da Esperança e os ardores da Caridade e todas as mais virtudes de que o Governo se prepara dar-nos o exemplo e por que este reino foi sempre tão feliz e privilegiado.
Redobremos as nossas orações, esperemos na misericórdia do Altíssimo que não desampare os que O invocam com a prática das boas obras; façamo-nos dignos da sua protecção e nossos desejos serão plenamente satisfeitos.
E para que chegue a notícia de todos, ordenamos ao nosso Rev. Desembargador Provisor mande passar as ordens do estilo com o teor desta nossa Portaria para as visitas desta Comarca e para todas as do Arcebispado, com ordem aos Rev.dos Párocos para copiarem esta no livro competente e a publicar a seus fregueses à estação da Missa conventual.
Braga, 20 de Setembro de 1820.
Com a rubrica de Sua Excelência Reverendíssima.

E depois de lido e subscrito, Auto e Portaria foi por todos assinado, com Sua Excelência Reverendíssima.
Eu, Custódio Luís de Araújo, secretário da Câmara Eclesiástica, o subscrevi.

Fr. Miguel, Arcebispo Primaz
D. António Alexandre da Cunha Reis, Deão
Manuel Ramos de Sá, Chantre
Mestre Escola Teotónio de Magalhães e Meneses
Manuel Inácio de Matos Sousa Cardoso, Tesoureiro-mor
Luís da Costa Lobo, Desembargador
Gaspar do Couto Ribeiro de Abreu
Bento José da Silva Camirão (?)
Joaquim José Félix de Oliveira e Silva
António Joaquim de Sá
João Correia Botelho
João Teodósio de Araújo Leão
José Maria de Melo
José Joaquim de Araújo Figueiredo
Joaquim de Mota
D. António do Amaral Castelo-Branco Noronha
José Joaquim de Cruz Vieira
João José Vaz Pereira, Provisor do Arcebispado
Manuel José Leite Pereira, Vigário Geral
João Marcos da Costa Pereira
José António Henriques de Moura
António Bernardo da Fonseca Memas (Moniz?)
José Pereira de Azevedo
João Ribeiro Pereira, Abade de S. João do Souto
Manuel da Cunha, Vigário da Sé Primaz
António José da Silva, Abade de Mazarefes
Tomás José de Carvalho, Prior de S. Vítor
João Álvares de Araújo, Vigário de S. Tiago da Cividade
Gaspar João Domingues da Costa, Vigário de S. José de S. Lázaro
Manuel José Antunes de Carvalho e Santos
António Luís da Cunha Peixoto e Campos
António José dos Santos, Abade de S. Cruz de Lima
José Pereira Guedes, Arcipreste de Viana
Manuel Joaquim Peixoto de Carvalho, Abade de Mós
Fr. Lopo António da Graça Barros, Reitor de Vilarelhos
João António Pereira Antas, Abade de Estevães
O Vice-Reitor João (ilegível) Magalhães
O Reitor, José António Barbosa de Araújo
O Pe. Francisco Martins Correia
O Pe. Miguel António Fernandes, Capelão de S. Teresa
Capelão das Órfãs José Domingues Machado
O Pe. Manuel José Gonçalves, Capelão da Conceição
O Capelão do Colégio, Manuel António de Oliveira
O Capelão de Salvador, Henrique José Carneiro
José da Costa Lobo, o Capelão dos Remédios
Manuel José Gomes, o Capelão
João da Silva Machado
João Evaristo Lino da Costa, Secretário de Sua Excelência Reverendíssima
João José da Cunha Tavares, Servo (?) Tercenário, Capelão de Sua Excelência Reverendíssima
O Abade Capelão Miguel António da Silva Portugal
João Rodrigues Ferreira, Capelão da Santa Cruz
José Bernardino Pereira Prestes, Tercenário Familiar de Sua Excelência (ilegível)
(Ilegível) Miguel António da Mota de Santo António
João Álvares, Capelão de S. Domingos

E não continha mais o dito Auto e Portaria e assinaturas, o qual, sendo-me dirigido da parte do mesmo Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor, por meu despacho mandei passar a presente dirigida aos Párocos da visita ao diante declarada para que em tudo observem e façam observar como nela se contém e copiando-a no respectivo livro a publiquem aos seus fregueses à estação da Missa conventual fazendo girar esta pela ordem do roteiro ao diante descrito e remetendo-a ao Pároco mais vizinho pelo mordomo da freguesia com a brevidade possível, sendo o último obrigado a remetê-la ao secretário da Câmara Eclesiástica que esta subscreveu, passando cada certidão do dia e hora em que lhe foi entregue para por este modo me constar da sua inteira observância.
Dada em Braga, sob sinal somente, aos quatro de Outubro de 1820.
E eu, Custódio Luís de Araújo, secretário da Câmara Eclesiástica, o subscrevi.

João José Vaz Pereira

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