Já noutra ocasião mostrámos como é
importante conhecer certos documentos emanados de Braga para avaliar o contexto
religioso e político concreto em que ocorreu a aparição da Santa Cruz em
Balasar. É sabido que a década de vinte do século XIX foi conturbadíssima desde
o seu princípio. A Junta Provisional de Supremo Governo do Reino saída da revolução
do Porto, em Agosto, logo em Setembro impôs à Igreja um “juramento de
fidelidade ao Rei, às Cortes e à Constituição que elas fizerem e de obediência
ao Supremo Governo do Reino”. Jurar fidelidade a uma constituição que não existia
era passar um cheque em branco aos revolucionários. Mas que se havia de fazer?
O extenso documento que se transcreve
abaixo regista o juramento feito em Braga e a ordem para que o efectuassem todos
os sacerdotes da Diocese. Como nele se manda, foi lido em todas as paróquias,
logo também em Balasar.
Juramento
de Fidelidade à Junta Provisional de Supremo Governo do Reino (1820)
O Dr. João José Vaz Pereira, Reitor do
Seminário de São Pedro, Chantre na Sé Primaz, Desembargador, Provisor e Vigário
Geral nesta Corte, Comarca e Arcebispado pelo Ex.mo e Rev.mo Arcebispo Primaz,
etc., faço saber aos Rev.dos Párocos da visita abaixo declarada que da parte do
mesmo Ex.mo e Rev.mo Arcebispo Primaz me foi enviada a Portaria e Auto abaixo copiado
a fim de se expedir a presente para sua devida execução, o qual Auto e Portaria
é do teor seguinte:
Auto de Juramento de Fidelidade
Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus
Cristo de mil oitocentos e vinte, aos vinte e um de Setembro do dito ano, nesta
cidade de Braga e Paço Arquiepiscopal, em presença do Ex.mo e Rev.mo Senhor
Arcebispo Primaz D. Fr. Miguel da Madre de Deus, compareceram o Rev.do Cabido
da Santa Sé Primacial, os Rev.dos Ministros da Relação Eclesiástica, os Rev.dos
Párocos das freguesias da mesma cidade e outros que nela se achavam presentes,
como também os Rev.dos Reitores dos Seminários de S. Pedro e S. Caetano, os
Capelães das Religiosas da dita cidade abaixo assinados a fim de prestarem
juramento de fidelidade ao Rei, às Cortes e à Constituição que elas fizerem; e
de obediência ao Supremo Governo do Reino. E assim com efeito o prestaram nas
mãos de Sua Excelência Reverendíssima, conformando-se em tudo com as ordens do
mesmo Supremo Governo e com o que se praticou no Auto de Câmara Geral da cidade
do Porto e com a Portaria e Exortação de Sua Excelência Reverendíssima a todo o
Clero do Arcebispado para satisfazerem o sobredito juramento, a qual Portaria é
do teor seguinte:
Em observância das Ordens da Junta
Provisional de Supremo Governo do Reino que mandam aos Rev.dos Párocos e mais
eclesiásticos deste Arcebispado prestar juramento de fidelidade ao Rei, às
Cortes, à Constituição que elas fizerem e obediência ao Supremo Governo,
ordenamos ao nosso Cabido e aos Rev.dos Ministros da nossa Relação e aos
Rev.dos Párocos desta nossa cidade compareçam perante Nós no dia vinte e um do
corrente mês, pelas onze horas da manhã, a fim de prestarem o juramento na
forma exposta, assinando o Auto que se há-de formalizar conforme o Auto da
Câmara Geral feito e assinado na cidade do Porto, o que também praticarão os
Rev.dos Vigários Gerais das comarcas nas mãos dos Rev.dos Vigários Gerais das
vagantes e, achando-se algum destes impedido, nas mãos do pároco mais antigo da
vila em que assiste.
E outrossim determinamos a todos e cada
um dos Rev.dos Párocos do mesmo Arcebispado compareçam, os desta Comarca de
Braga perante o nosso Rev. Desembargador Provisor e os da Comarca de Valença,
Vila Real, Chaves e Moncorvo perante os Rev.dos Vigários Gerais respectivos a
fim de igualmente prestar o juramento mencionado, o qual poderão satisfazer por
seu bastante procurador aqueles que mostrarem achar-se gravemente impedidos por
moléstia, o que hão-de cumprir dentro do peremptório termo de oito dias depois
da intimação desta nossa Portaria, assim como serão obrigados todos os Clérigos
de todas as Paróquias a comparecerem na Igreja, perante o seu respectivo Pároco
para prestarem com toda a solenidade o mencionado juramento, que será remetido
à cabeça da Comarca donde nos será enviado com o que aí mesmo se formalizar
para ser por Nós remetido ao Supremo Governo em tempo breve.
Esperamos do patriotismo e mais virtudes
do nosso respeitável Clero que gostosamente cumpra este dever, muito conforme à
doutrina do Apóstolo que manda obedecer às autoridades constituídas, não só
pelo temor, mas por consciência, roborando com palavras e exemplo a união e
concórdia que tão felizmente tem reinado
entre todos os Portugueses em crise na qual eram para recear-se os horrores da
guerra civil e da anarquia, louvando por isso a Deus, dirigindo ao mesmo Senhor
orações fervorosas a fim de que o desígnio e fadigas do Governo restaurador
consigam a desejada reparação dos males que vão levando ao precipício esta
nação digna de melhor sorte e que tanto se tem distinguido entre os povos
cristãos mais civilizados esperando que recobre seu esplendor antigo conservada
em toda a sua pureza a Santa Religião do Nosso Salvador Jesus Cristo, restituídos
os nossos foros e regalias que a desgraça dos tempos tinham posto em deplorável
esquecimento em que pelas Cortes Constitucionais se nos hão-de conservar
ilesas, salva sempre a fidelidade e vassalagem que se deve ao nosso adorado Monarca
Senhor D. João VI e à Augusta Dinastia da Casa de Bragança.
Confiamos no Senhor que nos dará os
auxílios necessários para o complemento desta grande obra conservando no meio
de nós a pureza da Fé, as doçuras da Esperança e os ardores da Caridade e todas
as mais virtudes de que o Governo se prepara dar-nos o exemplo e por que este
reino foi sempre tão feliz e privilegiado.
Redobremos as nossas orações, esperemos na
misericórdia do Altíssimo que não desampare os que O invocam com a prática das
boas obras; façamo-nos dignos da sua protecção e nossos desejos serão
plenamente satisfeitos.
E para que chegue a notícia de todos, ordenamos
ao nosso Rev. Desembargador Provisor mande passar as ordens do estilo com o teor
desta nossa Portaria para as visitas desta Comarca e para todas as do
Arcebispado, com ordem aos Rev.dos Párocos para copiarem esta no livro competente
e a publicar a seus fregueses à estação da Missa conventual.
Braga, 20 de Setembro de 1820.
Com a rubrica de Sua Excelência
Reverendíssima.
E depois de lido e subscrito, Auto e Portaria
foi por todos assinado, com Sua Excelência Reverendíssima.
Eu, Custódio Luís de Araújo, secretário
da Câmara Eclesiástica, o subscrevi.
Fr. Miguel, Arcebispo Primaz
D. António Alexandre da Cunha Reis, Deão
Manuel Ramos de Sá, Chantre
Mestre Escola Teotónio de Magalhães e
Meneses
Manuel Inácio de Matos Sousa Cardoso,
Tesoureiro-mor
Luís da Costa Lobo, Desembargador
Gaspar do Couto Ribeiro de Abreu
Bento José da Silva Camirão (?)
Joaquim José Félix de Oliveira e Silva
António Joaquim de Sá
João Correia Botelho
João Teodósio de Araújo Leão
José Maria de Melo
José Joaquim de Araújo Figueiredo
Joaquim de Mota
D. António do Amaral Castelo-Branco
Noronha
José Joaquim de Cruz Vieira
João José Vaz Pereira, Provisor do
Arcebispado
Manuel José Leite Pereira, Vigário Geral
João Marcos da Costa Pereira
José António Henriques de Moura
António Bernardo da Fonseca Memas (Moniz?)
José Pereira de Azevedo
João Ribeiro Pereira, Abade de S. João do
Souto
Manuel da Cunha, Vigário da Sé Primaz
António José da Silva, Abade de
Mazarefes
Tomás José de Carvalho, Prior de S. Vítor
João Álvares de Araújo, Vigário de S.
Tiago da Cividade
Gaspar João Domingues da Costa, Vigário
de S. José de S. Lázaro
Manuel José Antunes de Carvalho e Santos
António Luís da Cunha Peixoto e Campos
António José dos Santos, Abade de S.
Cruz de Lima
José Pereira Guedes, Arcipreste de Viana
Manuel Joaquim Peixoto de Carvalho,
Abade de Mós
Fr. Lopo António da Graça Barros, Reitor
de Vilarelhos
João António Pereira Antas, Abade de
Estevães
O Vice-Reitor João (ilegível) Magalhães
O Reitor, José António Barbosa de Araújo
O Pe. Francisco Martins Correia
O Pe. Miguel António Fernandes, Capelão
de S. Teresa
Capelão das Órfãs José Domingues Machado
O Pe. Manuel José Gonçalves, Capelão da
Conceição
O Capelão do Colégio, Manuel António de
Oliveira
O Capelão de Salvador, Henrique José
Carneiro
José da Costa Lobo, o Capelão dos
Remédios
Manuel José Gomes, o Capelão
João da Silva Machado
João Evaristo Lino da Costa, Secretário
de Sua Excelência Reverendíssima
João José da Cunha Tavares, Servo (?) Tercenário, Capelão de Sua
Excelência Reverendíssima
O Abade Capelão Miguel António da Silva
Portugal
João Rodrigues Ferreira, Capelão da
Santa Cruz
José Bernardino Pereira Prestes, Tercenário
Familiar de Sua Excelência (ilegível)
(Ilegível)
Miguel
António da Mota de Santo António
João Álvares, Capelão de S. Domingos
E não continha mais o dito Auto e
Portaria e assinaturas, o qual, sendo-me dirigido da parte do mesmo
Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor, por meu despacho mandei passar a presente
dirigida aos Párocos da visita ao diante declarada para que em tudo observem e
façam observar como nela se contém e copiando-a no respectivo livro a publiquem
aos seus fregueses à estação da Missa conventual fazendo girar esta pela ordem
do roteiro ao diante descrito e remetendo-a ao Pároco mais vizinho pelo mordomo
da freguesia com a brevidade possível, sendo o último obrigado a remetê-la ao
secretário da Câmara Eclesiástica que esta subscreveu, passando cada certidão
do dia e hora em que lhe foi entregue para por este modo me constar da sua
inteira observância.
Dada em Braga, sob sinal somente, aos quatro
de Outubro de 1820.
E eu, Custódio Luís de Araújo, secretário
da Câmara Eclesiástica, o subscrevi.
João José Vaz Pereira
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